RETRATO DE MÃE

Depois de muito tempo sobre os quadros sombrios do calvário,
Judas, cego no além, errava solitário.
Era triste a paisagem, o céu era nevoento,
Cansado de remorso e sofrimento,
Sentara-se a chorar.
Nisso, nobre mulher de planos superiores,
Nimbada de celestes esplendores
Que ele não conseguia divisar,
Chega e afaga a cabeça do infeliz.
Em seguida, em tom de carinho profundo,
Quase que em oração, ela lhe diz:

– Meu filho, por que choras?
–Acaso, não sabeis?

Replica o interpelado, claramente agressivo.
–Sou um morto, e estou vivo.
–Matei-me e novamente estou de pé,
Sem consolo, sem lar, sem amor e sem fé.
–Não ouviste falar de Judas, o traidor?
Sou eu, que aniquilei a vida do Senhor.
–A princípio julguei poder fazê-lo rei,
Mas apenas lhe impus
Sacrifício, martírio, sangue e cruz,
E em flagelo e aflição
Eis a que a minha vida agora se reduz.
–Afastai-vos de mim,
Deixai-me padecer neste inferno sem fim.
–Nada me pergunteis, retirai-vos, Senhora!
–Nada sabeis da mágoa que me agita,
Nunca penetrareis minha dor infinita.
–O assunto que lastimo é unicamente meu!
No entanto, a dama, calma, respondeu:

–Meu filho, sei que sofres, sei que lutas,
Sei a dor que te causa o remorso que escutas.
Venho apenas falar-te
Que Deus é sempre amor em toda parte!
E, acrescentou, serena:
–A bondade do céu jamais condena.
Venho por mãe, a ti, buscando um filho amado.
Sofre com paciência a dor e a prova,
Terás em breve uma existência nova.
Não te sintas sozinho ou desprezado!

Maria Dolores
Psicografia de Chico Xavier